Pequeno Manual da Riqueza – Parte 2

Parte 2 – Notas do Tesouro Nacional em Detalhes

Notas do Tesouro Nacional

Dando seguimento ao Pequeno Manual da Riqueza – parte 1, vamos analisar em detalhes as NTN’s – Notas do Tesouro Nacional.

Atualmente, o Tesouro oferece apenas duas classes de NTN com pagamento regular de cupom de juros: O Tesouro Prefixado com Juros Semestrais, antiga NTN-F (Notas do Tesouro Nacional – Série “F”), que pagam cupons de valor pré-fixados, e o Tesouro IPCA+ com Juros Semestrais, antiga NTN-B (Notas do Tesouro Nacional – Série “B”), que pagam um cupom atrelado indiretamente ao IPCA.

No passado, já foram oferecidas outras NTN, como a NTN-C, indexada ao IGPM, e a NTN-D, indexada ao dólar, mas hoje o tesouro apenas recompra os títulos que ainda circulam no mercado, e não os oferece para investimento. Vamos então focar apenas nessa duas notas que atualmente são oferecidas.

NTN-F

A NTN-F é um título cujo valor nominal é constante e vale R$ 1.000,00. Isso significa que, na data do vencimento, o tesouro irá pagar R$ 1.000,00 por título ao portador. Adicionalmente, ele rende 10% do valor nominal ao ano em cupons de juros, pagos semestralmente, ou seja, 4,881% ao semestre. Trata-se portanto de um título pré-fixado.

Como o valor de face é constante, calculamos que cada título desses confere um rendimento semestral de R$48,81 ao portador, em adição aos R$1000,00 a serem resgatados no vencimento do título. O gráfico a seguir mostra o fluxo de pagamento típico de uma NTN-F:

A NTN-F o título ideal para quem quer saber exatamente o valor nominal de quanto irá receber no futuro, dado que tais valores já são conhecidos na data da compra. Atualmente o tesouro oferece apenas um vencimento para esse título, em 01/01/2027. Os pagamentos dos cupons de juros ocorrem em 1° de janeiro e 1° de julho.

Em resumo: Quando você compra uma NTN-F, você comprou o direito de receber R$ 1.000,00 na data do vencimento, e uma série de pagamentos intermediários de R$48,81 por semestre.

Assim sendo, você garante uma “renda fixa” até o vencimento, no entanto deve se lembrar que a inflação pode devorar parte do valor real desse rendimento. Pode ser interessante reinvestir parte dos cupons em novos títulos de maneira a se conseguir uma renda crescente, mas a maneira mais simples de se conseguir isso é optar pela NTN-B, como veremos a seguir.

Uma característica importante da NTN-F é que sempre que sua taxa de mercado estiver acima de 10%, o título está sendo negociado com deságio, ou seja, seu valor de mercado está menor do que seu valor nominal. Similarmente, quando as taxas estão abaixo de 10%, o título está sendo negociado com ágio, ou seja, acima do seu valor nominal. Na realidade, número não é exatamente 10% por conta do spread de compra e venda e custos operacionais, mas é um indicador bem acurado.

NTN-B

A NTN-B é um pouco mais peculiar. Seu valor intrínseco é o VNA – Valor Nominal Atualizado – que é calculado a partir do IPCA acumulado desde 15/7/2000 até a data atual. Ou seja: o seu valor nominal é atualizado a cada dia, ao contrário das NTN-F, que possuem valor nominal constante.

O título ainda confere um rendimento de 6% anual sobre o VNA ao portador, pagos semestralmente, sendo portanto 2,96% por semestre. O VNA é o mesmo para todas as NTN-B’s, independentemente da data de vencimento da mesma.

O calendário de pagamentos de cupons varia, mas temos apenas 2 grupos: 1 grupo pagando em 15 fevereiro/15 de agosto e outro em 15 de maio/15 de novembro. E dado que o fluxo de pagamentos é uma porcentagem do VNA, temos que os pagamentos são indexados ao IPCA, e portanto seus rendimentos futuros são automaticamente corrigidos por esse indexador.

No dia do vencimento, o papel é liquidado, e o valor financeiro correspondente ao VNA é depositado integralmente em dinheiro na conta do portador.

O gráfico abaixo mostra o fluxo de pagamentos de uma NTNB:

A NTN-B é o título ideal para quem quer ver sua renda corrigida periodicamente pelo IPCA, sem se preocupar com reinvestimentos para compensar a inflação.

Atualmente (Julho de 2018) existem as seguintes séries disponíveis para a compra no tesouro direto:

Note que pode ser interessante ter títulos com 2 vencimentos distintos de maneira a se obter uma renda trimestral ao invés de semestral.

Em resumo: Quando você compra uma NTN-B, você comprou o direito de receber R$1000,00 x (IPCA acumualdo desde 15/7/2000) na data do vencimento, e uma série de pagamentos semestrais de 2,96% desse valor (considerando o IPCA até a data desses pagamentos)

Assim sendo, esse título além de oferecer um fluxo de pagamentos regular e previsível, ainda lhe garante que os rendimentos recebidos irão automaticamente acompanhar a inflação. Claro que cada pessoa tem a sua própria inflação, dependendo de seus hábitos de consumo, mas ainda assim há um aumento nominal de valores entre um pagamento e outro (a não ser que tenhamos um IPCA negativo ??)

Ou seja, se por um lado não é possível determinar o valor nominal dos pagamentos futuros, por outro, sabe-se que ele nada mais é do que o valor anterior corrigido pelo IPCA do período. O valor do VNA pode ser acompanhado no site da ANBIMA, e a título de exercício você pode saber quanto seria o valor de um cupom pago hoje simplesmente calculando 2,96% sobre esse valor.

Similarmente à NTN-F, a NTN-B apresenta um deságio quando negociada a taxas de mercado acima de 6%, e ágio abaixo desse valor.

Precificação

Dadas as características desses dois papéis, fica a pergunta óbvia: Quanto deve custar cada um deles?

Quanto custa o direito de receber R$1000,00 em 1/1/2027 com recebimentos semestrais de R$48,81 até lá? E o direito de receber R$1000 x IPCA em 15/02/2026 com intermediárias semestrais, vale quanto?

É lógico que as condições atuais de mercado irão determinar o seu preço, de uma maneira ou de outra.

Uma alternativa para se chegar ao preço ideal é destrinchar a documentação técnica do Tesouro da NTNB e da NTNF para chegarmos à resposta. Parece um pouco complicado a princípio para quem não é do ramo, mas no fim tudo se resume a trazer a valor presente todos os pagamentos futuros, coisa que se aprende com um pouco de matemática financeira.

Recomendo, a quem tiver interesse, dar uma lida com calma nesses documentos e tentar calcular o valor “na mão”, apenas uma vez na vida, para uma melhor compreensão das variáveis envolvidas. A NTN-F é mais simples de se calcular, e a única ferramenta necessária é uma planilha (excel, open office, etc) com a ferramenta “goal seek” (atingir meta) para o cálculo da taxa.

Quem fizer esse exercício vai logo notar duas coisas: A primeira, é que ambas as NTN’s possuem as características típicas de títulos pré-fixados: Quanto maior a taxa de retorno, menor o seu preço, e vice versa. A segunda é que a taxa SELIC – que é uma taxa de referência intradiária, apresentada em valores anualizados – não aparece nas contas: o que aparece é justamente a taxa de remuneração futura. É por isso que no fundo não faz muito sentido comparar a rentabilidade de uma NTN com a rentabilidade da SELIC: são taxas para tempos de maturação distintos.

Mas a alternativa mais fácil de saber o valor atual esses títulos é simplesmente acompanhar o site do tesouro, que já apresenta as taxas e valores de mercado no momento.

No caso das NTN-F, o que vemos na tabela é a taxa nominal de rendimento, ou seja, você ainda precisa considerar que parte desse rendimento é uma mera reposição da inflação.

Já no caso das NTN-B, a taxa que vemos já é a rentabilidade real – acima da inflação – que o investidor irá obter naquele momento até o vencimento. Lembrando, é claro, que estamos falando da inflação oficial do período, medida pelo IPCA. Existe o risco maquiatório ?.

Note que o valor dos cupons de pagamento das NTN’s, bem como o valor de resgate, independe de quanto você pagou pelo título. Daí a vantagem em esperar por taxas mais altas – ou seja, preços mais baixos. O que vai alterar é justamente o seu rendimento nominal – e esse número é exatamente o valor da taxa apresentada. E vai ser carregado até o vencimento.

Quem quiser consultar o histórico de preços e taxas pode acessar o site tdcharts.info, que possui um link permanente aqui ao lado.

Impostos e taxas

Claro que o governo irá cobrar um imposto sobre um título que o próprio governo oferece, né? Mas tem mais gente tirando casquinha de você, fique tranquilo.

De partida, você já paga uma taxa de negociação no valor de 0,10% do investimento para o tesouro. Além disso há uma taxa de custódia de 0,3% ao ano sobre o valor custodiado, que são pagas semestralmente, e debitadas automaticamente da sua conta corrente da corretora (por isso é sempre bom ficar atento ao calendário de taxas, em janeiro e julho).

As corretoras também costumam cobrar uma taxa de custódia, em geral na faixa de 0,1% a 1,0% – no entanto sempre existe alguma corretora que oferece taxa zero, basta procurar no ranking dos agentes de custódia, do próprio site do tesouro direto. Você pode também tentar barganhar com a corretora, dependendo do valor aplicado.

Na venda antecipada ou no vencimento do título, incide-se também imposto de renda sobre o lucro da operação sobre os títulos, ou seja, subtrai-se o valor de compra do valor de venda e aplica-se a taxa de IR, considerando a tabela regressiva. O valor que você recebe nessa operação em sua corretora já é líquido e vem especificado. E caso você fique menos que um mês com o título, ainda tem o IOF, que é bem salgado. TD em geral não é uma boa opção para especular no curto prazo por conta isso.

Sobre os recebimentos de cupom de juros, incide-se também a tabela regressiva do imposto de renda, e um desconto relativo à taxa de custódia sobre os cupons.

Resumo das NTN’s

Ao comprar títulos públicos com pagamento de juros, estamos comprando uma renda futura sem risco, com todas as condições previamente pactuadas. Não há nenhum instrumento financeiro que sequer se pareça com isso no mercado.

As NTN-F’s possuem a vantagem de ter um valor nominal previsível de recebimento, já inteiramente conhecido na hora da compra, e a desvantagem de não ter prazos muito longos – claro que isso pode mudar a gosto do tesouro nacional, mas atualmente só temos uma opção disponível no mercado, para daqui a 10 anos.

Já as NTN-B’s possuem prazos bem longos de vencimento – a mais longa vence daqui a 32 anos – garantindo uma renda por um belo período de tempo. E ainda corrigem o valor recebido pelo IPCA. No entanto, seu rendimento líquido sobre o valor aplicado é menor que o da NTN-F – esse é o trade-off da correção pelo IPCA.

No próximo artigo, veremos estratégias para investir nesses títulos e alguns comparativos de retornos.

Antes de encerrarmos, um comentário sobre a Bolha Imobiliária: uma simples análise no site do Tesouro Direto é suficiente para analisar o quão absurdo está o mercado imobiliário na atualidade. Temos que o retorno livre de risco é de no mínimo 9,5% líquido ao ano, considerando as NTN-F, no entanto o retorno médio de aluguel na ordem de 3% líquido ao ano. Seriam os imóveis investimentos mais seguros que os títulos públicos?

Não é de se estranhar que o Brasileiro médio creia que sim, especialmente os mais velhos, que já passaram por hiperinflação, confiscos de poupança e toda uma miríade de planos econômicos mirabolantes. E por essa razão, pessoalmente acredito que os imóveis estarão sobrevalorizados por mais algum tempo até que o mercado se acerte. Até pelo menos até essa geração fragile snowflake herdar esses imóveis e tenha que vendê-los pelo preço que for por estarem falidos.